Cidades Privadas
Formando em Ciências Econômicas - UFRN.
Na semana passada, um
projeto polêmico do governo de Honduras estampou os noticiários mundo afora. O
projeto prevê a construção de “cidades-modelo”, chamadas de Regiões Especiais
de Desenvolvimento, criadas por investidores privados (sobretudo estrangeiros)
e administradas de forma autônoma. As cidades possuirão leis, polícia, governo,
sistema tributário e política monetária próprias, totalmente implementados e
geridos por instituições privadas.
Os idealizadores do projeto
afirmam que o objetivo é “promover o desenvolvimento, através da criação de
empregos e oportunidades”; mas, qual desenvolvimento deseja-se alcançar? O
desenvolvimento que satisfaz as necessidades humanas fundamentais e que busca
equidade e justiça social ou o crescimento econômico dado pela expansão da produção
e com efeitos sociais perversos? Num Estado controlado pelo capital privado,
onde os interesses individuais se sobrepõem aos interesses coletivos, não é de
se admirar que a última opção seja a escolhida.
Os fundadores, ou melhor, os
investidores veem nessas cidades a oportunidade do seu capital reproduzir-se
livremente, inclusive através de atividades consideradas ilícitas em outros
Estados nacionais. As cidades-modelo representam assim um porto seguro para o
capital, um local onde este dita suas próprias regras de reprodução e pode
ampliar-se continuamente sem “interferências sociais”.
A ilusão de um mercado
ideal, sem Estado e sem conflitos permeia o pensamento econômico há muito
tempo. Seja através da “mão invisível” de Adam Smith ou do Estado regulador de
Milton Friedman, o “livre mercado” parece ser a utopia moresiana[1]
dos economistas liberais. No entanto, com a criação das cidades privadas, o capitalismo
parece chegar ao seu ápice de dominação, com a vitória do capital sobre os
interesses sociais coletivos.
Esquece-se, porém, sobre
qual é a verdadeira finalidade do Estado. Friedrich Engels afirmou que o Estado
surgiu a partir da luta de classes, de maneira a regulamentá-la juridicamente e
a garantir a ordem social. Portanto, como seria possível ao capital privado,
que busca unicamente o lucro, atender aos anseios da população e satisfazer
suas necessidades mais urgentes? Como esse Estado privado reagirá diante da
massa trabalhadora que vive as margens do sistema produtor de mercadorias? Como
esses gestores reagirão quando os custos forem maiores que os benefícios
privados, mas, que compensem pelos benefícios coletivos gerados? Muitas
questões ainda necessitam ser analisadas antes de os governos nacionais cederem
à pressão do capital internacional e abrirem mão da sua soberania. Contudo, a
experiência já mostrou que a soma dos interesses individuais difere do bem
estar coletivo e somente a ação do Estado é capaz de direcionar a sociedade
rumo a um desenvolvimento mais justo e includente.
[1]
Alusão à obra Utopia de Thomas More publicada em 1516.
O Blog Economia e Outras Coisas sente-se agraciado
pela colaboração de Fábio Nascimento,
formando em Ciências Econômicas - UFRN,
enviando-nos esse excelente artigo.
Obrigado, Fábio!
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