Cidades Privadas

A quem pertencem as cidades?


Por Fábio Nascimento,
Formando em Ciências Econômicas - UFRN.

Na semana passada, um projeto polêmico do governo de Honduras estampou os noticiários mundo afora. O projeto prevê a construção de “cidades-modelo”, chamadas de Regiões Especiais de Desenvolvimento, criadas por investidores privados (sobretudo estrangeiros) e administradas de forma autônoma. As cidades possuirão leis, polícia, governo, sistema tributário e política monetária próprias, totalmente implementados e geridos por instituições privadas.
Os idealizadores do projeto afirmam que o objetivo é “promover o desenvolvimento, através da criação de empregos e oportunidades”; mas, qual desenvolvimento deseja-se alcançar? O desenvolvimento que satisfaz as necessidades humanas fundamentais e que busca equidade e justiça social ou o crescimento econômico dado pela expansão da produção e com efeitos sociais perversos? Num Estado controlado pelo capital privado, onde os interesses individuais se sobrepõem aos interesses coletivos, não é de se admirar que a última opção seja a escolhida.
Os fundadores, ou melhor, os investidores veem nessas cidades a oportunidade do seu capital reproduzir-se livremente, inclusive através de atividades consideradas ilícitas em outros Estados nacionais. As cidades-modelo representam assim um porto seguro para o capital, um local onde este dita suas próprias regras de reprodução e pode ampliar-se continuamente sem “interferências sociais”.
A ilusão de um mercado ideal, sem Estado e sem conflitos permeia o pensamento econômico há muito tempo. Seja através da “mão invisível” de Adam Smith ou do Estado regulador de Milton Friedman, o “livre mercado” parece ser a utopia moresiana[1] dos economistas liberais. No entanto, com a criação das cidades privadas, o capitalismo parece chegar ao seu ápice de dominação, com a vitória do capital sobre os interesses sociais coletivos.
Esquece-se, porém, sobre qual é a verdadeira finalidade do Estado. Friedrich Engels afirmou que o Estado surgiu a partir da luta de classes, de maneira a regulamentá-la juridicamente e a garantir a ordem social. Portanto, como seria possível ao capital privado, que busca unicamente o lucro, atender aos anseios da população e satisfazer suas necessidades mais urgentes? Como esse Estado privado reagirá diante da massa trabalhadora que vive as margens do sistema produtor de mercadorias? Como esses gestores reagirão quando os custos forem maiores que os benefícios privados, mas, que compensem pelos benefícios coletivos gerados? Muitas questões ainda necessitam ser analisadas antes de os governos nacionais cederem à pressão do capital internacional e abrirem mão da sua soberania. Contudo, a experiência já mostrou que a soma dos interesses individuais difere do bem estar coletivo e somente a ação do Estado é capaz de direcionar a sociedade rumo a um desenvolvimento mais justo e includente.



[1] Alusão à obra Utopia de Thomas More publicada em 1516.




O Blog Economia e Outras Coisas sente-se agraciado 
pela colaboração de Fábio Nascimento, 
formando em Ciências Econômicas - UFRN, 
enviando-nos esse excelente artigo.
Obrigado, Fábio!      


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